Colunistas

Qual é o grau de controle dos frigoríficos da Amazônia?

Último levantamento do Radar Verde mostra que nenhum das empresas de carne que operam na região vende carne 100% livre de desmatamento

Rebanho do frigorífico Independência (Divulgação/Independência/Divulgação)

Rebanho do frigorífico Independência (Divulgação/Independência/Divulgação)

AM

Publicado em 30 de abril de 2025 às 16h54.

Nos últimos anos, o mercado internacional tem deixado cada vez mais claro que tem restrições à carne brasileira. No ano ado, o Carrefour anunciou que não iria mais comprar carne produzida por países do Mercosul na França. Este ano, a China, um de nossos principais importadores, suspendeu temporariamente a sua relação com alguns frigoríficos, alegando que eles não estavam em conformidade com suas exigências.

Mesmo que essas decisões não tenham se mantido e que o Brasil esteja aparentemente tranquilo, vendendo muita carne para os Estados Unidos, a pecuária brasileira precisa, para ontem, desassociar a sua imagem do desmatamento. Em um mercado com guerras comerciais cada vez mais acirradas, estar vulnerável por esse motivo é desnecessário e um risco nada desejável.

Nada disso é novidade para o setor da agropecuária brasileiro. As empresas já sabem há algum tempo que os principais investidores globais tendem a ficar cada vez mais exigentes quanto aos quesitos socioambientais.

Ainda assim, em 2021, a pecuária bovina foi responsável por mais de 50% do total das emissões de gases de efeito estufa no setor e, em 2023, ainda estava relacionada a pelo menos 90% da área desmatada na Amazônia, onde está 43% do rebanho bovino do país.

Lentamente, algumas políticas têm sido implementadas pelos frigoríficos, empresas essenciais para o controle da cadeia da carne, uma vez que são elas que compram das fazendas e, por isso, podem fazer exigências aos produtores. No entanto, segundo o último levantamento anual do Radar Verde, indicador público do setor, nenhuma das 146 empresas de carne localizadas na Amazônia Legal pode afirmar que vende carne livre de desmatamento.

Em pleno 2025, ano em que ninguém mais pode dizer que não está ciente sobre a importância de conservar a floresta em pé para frear o avanço das mudanças climáticas que, inclusive, estão associadas ao aumento dos eventos extremos que, vejam só, vivem causando prejuízos para o setor da agropecuária.

Segurança na agropecuária

De acordo com o último Radar Verde dos frigoríficos, algumas empresas já têm um bom controle de seus fornecedores diretos, ou seja, a fazenda da qual compram os animais para o abate. Isso é feito principalmente usando a Guia de Trânsito Animal (GTA) e o cruzamento com mapas de propriedade (Cadastro Ambiental Rural - CAR) e de desmatamento. No entanto, os frigoríficos ainda não avançaram em políticas de rastreamento robusto dos fornecedores indiretos, ou seja, as outras propriedades pelas quais os animais am ao longo da vida.

Sem o controle das fazendas indiretas, nenhum frigorífico da Amazônia Legal pode afirmar que está livre do desmatamento. Isso porque, tradicionalmente, essa prática ilegal tem sido mais concentrada nas fazendas de cria e recria — fornecedoras indiretas — justamente porque sabem que as fazendas de engorda — fornecedoras diretas — são mais controladas. O Radar Verde mostra que algumas empresas chegam a pedir aos fornecedores diretos que informem voluntariamente  sobre a origem do gado indireto por meio de GTAs, mas nem sempre obtêm essas informações. Além disso, falta auditoria independente sobre o cumprimento do controle destes fornecedores indiretos.

Outro ponto analisado pela Radar Verde merece atenção: o Grau de Exposição ao Risco de Desmatamento, ou seja, a área com fatores de risco nas zonas potenciais de compra de gado das empresas. Fatores que incluem desmatamento recente, áreas embargadas por desmatamento ilegal e risco de desmatamento no curto prazo, práticas inaceitáveis para empresas que estão em busca de serem mais sustentáveis. De acordo com o relatório, os cinco frigoríficos com maior Grau de Exposição ao Risco de Desmatamento são, nesta ordem: JBS, Frigo Manaus, Frialto, Masterboi e Amazon Boi. Essas empresas precisam ser cobradas sobre isso!

Frigoríficos da Amazônia

Desde 2022, o Instituto O Mundo Que Queremos e o Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia (Imazon) divulgam, anualmente, o Radar Verde, que é uma classificação dos frigoríficos da Amazônia e os principais supermercados do país de acordo com o controle e transparência sobre sua cadeia da carne. A intenção é ajudar o setor como um todo a avançar no controle sobre seus fornecedores, vendendo carne livre de desmatamento para consumidores cada vez mais conscientes.

Essa ferramenta é um instrumento estratégico para diversas finalidades, pois pode orientar investidores, bancos, compradores corporativos e importadores, permitindo identificar riscos e priorizar ações para promover cadeias mais sustentáveis.  Serve também como base para governos e consumidores na formulação de políticas e escolhas que favoreçam empresas mais comprometidas. E, por último, mas não menos importante, é útil para o próprio setor, pois o ajuda a entender seu estágio atual e direcionar melhorias, garantindo maior segurança, qualidade e competitividade para a pecuária brasileira.

Os frigoríficos Marfrig, Minerva, Rio Maria, Masterboi, Frigol, JBS, Mercúrio Alimentos, Fortefrigo, Mafrinorte, Valencio, Fribev, Frigorífico Altamira e Frigonorte tiveram os melhores resultados na última edição do relatório, que pode ser conferido na íntegra aqui. De forma geral, essas empresas têm um bom controle dos fornecedores diretos, mas ainda precisam melhorar em relação aos indiretos, o problema que expliquei acima.

Além das mais bem classificadas no ranking, outra empresa merece destaque: o frigorífico Plena Alimentos que, pela primeira vez, participou voluntariamente da pesquisa, enviando as respostas ao questionário. Participar voluntariamente é uma forma de mostrar que está se movimentando para melhorar. Essa empresa, inclusive, talvez justamente por isso, foi uma das que apresentou uma nota melhor que na edição ada.

Todas as demais empresas continuaram sendo avaliadas apenas através das informações públicas que disponibilizam nos seus sites. E esse ainda é um grande desafio para os pesquisadores. Em 2023, 38 empresas frigoríficas possuíam sites, mas muitas não ofereciam dados sobre o controle de gado para avaliação do Grau de Controle da Cadeia. Em 2024, esse número cresceu para 41, mas a quantidade de informações relevantes ainda permanece pouco expressiva. Ou seja, ainda estamos longe de chegar à sonhada transparência que o Radar Verde quer ajudar a construir. Em 2025 esses resultados precisam melhorar!

Acompanhe tudo sobre:FrigoríficosCarne bovinaAgropecuáriaBois